m dos segmentos que mais registram acidentes de trabalho no Brasil, a construção civil é o primeiro do país em incapacidade permanente, o segundo em mortes (perde apenas para o transporte terrestre) e o quinto em afastamentos com mais de 15 dias.
De acordo com informações coletadas pelo Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho, entre 2012 e 2018, no Brasil, aconteceram cerca de 4,4 milhões de acidentes de trabalho. Desses, 97 mil foram na construção civil. Ainda, dos 31,9 mil acidentes com óbito, 2.666 foram no setor da construção.
Nesse sentido, os acidentes de trabalho mais comuns na construção civil são as quedas de alturas, os cortes e lacerações pelo manuseio de objetos e equipamentos afiados e as lesões por esforços repetitivos, especialmente para os furadores de pedra (operadores de britadeiras).
Além disso, acrescentamos também os danos auditivos pela exposição ao som alto por tempo prolongado e às picadas por animais peçonhentos.
Sabendo de todas as dúvidas que envolvem esse tema tão delicado, preparamos este artigo, para você entender o que é acidente de trabalho, como a empresa deve agir e quais são os direitos do empregado acidentado.
SUMÁRIO
ToggleO que é acidente de trabalho?
De acordo com a Lei nº 8213/91, o acidente de trabalho é aquele que ocorre com o empregado em decorrência do exercício da atividade profissional realizada para o empregador, provocando lesão corporal ou alguma perturbação funcional que resulte na perda ou na redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho, ou na morte.
A lesão corporal, como o próprio termo já esclarece, é aquela que causa algum dano ao corpo do empregado, como um corte, fratura, contusão, amputação, entre outros. Ou seja, abala a integridade física da pessoa, causando alguma alteração, anatômica ou funcional, interna ou externa.
Já a perturbação funcional, também citada pela lei, busca abranger as doenças ocupacionais, também chamadas de profissionais, e as do trabalho. São os casos em que o trabalhador sofre danos ao funcionamento de algum órgão, sentido ou parte do corpo.
Quais são os tipos de acidente de trabalho para a CLT?
Para que não ocorra confusão, o acidente de trabalho pode ser dividido em três categorias: típico, atípico ou de trajeto. Entenda como a legislação os diferencia:
Acidente típico
Acontece no local de trabalho ou em seus arredores e dentro do expediente de trabalho. Eles costumam ocorrer em decorrência de imprudência, negligência, ou ainda por causas naturais, como deslizamentos, enchentes ou raios. Esse tipo de acidente inclui os períodos em que o funcionário está viajando a serviço do empregador.
Acidente atípico
Específico para quando acontece por conta da repetição de atividades do trabalho ou doença que tenha ligação com o ofício. A LER é sempre o melhor exemplo. Outros acidentes que podem ser considerados atípicos são:
- ato de agressão ou sabotagem;
- contaminação acidental durante o trabalho;
- acidente durante os períodos destinados a alimentação e descanso.
Acidente de trajeto
Ocorre durante o percurso da pessoa entre o trabalho e sua casa e vice-versa, tanto em veículo próprio ou no transporte da empresa quanto no transporte público.
Outras situações enquadradas como acidente de trabalho.
Além dos três tipos que descrevemos acima, a Lei n° 8.213/91 ainda equipara a acidente de trabalho os incidentes que forem causados por terceiros ou companheiros de trabalho, durante o serviço do empregado.
Assim, ofensas físicas intencionais, atos de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho seriam casos de acidente de trabalho, assim como falhas culposos, decorrentes de imprudência, de negligência ou de imperícia.
Outra situação descrita em lei como acidente de trabalho é a hipótese de desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior, ocorridos no local e horário de trabalho.
No mais, vale destacar também, que os acontecimentos ligados ao trabalho, mesmo que não tenham sido a causa única, seriam acidentes de trabalho se contribuírem para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho ou até morte.
O que não é acidente de trabalho?
É importante frisar que para ser considerado acidente de trabalho, é fundamental existir o nexo de causalidade entre o trabalho e o acidente. Esse nexo pode ocorrer mesmo fora do local de trabalho, basta que o funcionário esteja a serviço da empresa.
No que diz respeito às doenças do trabalho, que são equiparadas ao acidente de trabalho, nem todos os casos podem ser enquadrados, conforme prevê a legislação de regência no artigo 20, parágrafo 1º, sendo elas:
- Doença degenerativa;
- Doenças inerentes a grupo etário;
- Aquelas que não produzam incapacidade laborativa;
- Doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolve, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.
Finalizando essa questão, devemos ressaltar ainda, que para fins previdenciários considera-se estabelecido o nexo entre trabalho e agravo (acidente ou doença) quando se verificar o nexo técnico epidemiológico entre a atividade da empresa a ação motivadora da incapacidade, assim prevê o decreto que regulamenta a previdência social em seu artigo 337. Portanto, mais uma vez reforçando a necessidade de ligação entre as causas da morbidade e o trabalho.
Qual é a obrigação da empresa?
Dependendo do ramo da organização, os trabalhadores possuem grandes chances de sofrerem algum dos tipos de acidentes de trabalho que mencionamos acima. Por isso, as empresas devem estar preparadas e cumprir com todas as obrigações previstas em lei quando essas situações ocorrerem.
Mas afinal, quais são essas obrigações? Podemos separá-las nos seguintes tópicos:
- Oferecer os devidos equipamentos de proteção individual;
- Enviar o Comunicado de Acidente do Trabalho (CAT);
- Cumprir com os direitos previstos aos trabalhadores acidentados.
Vamos entender melhor cada um deles.
Segundo a Norma Regulamentadora Nº6, os Equipamentos de Proteção Individual são dispositivos usados pelos funcionários destinados a protegê-los de eventuais riscos que possam ameaçar sua saúde e segurança no trabalho.
As organizações são obrigadas a conceder gratuitamente estes equipamentos em três situações:
- Quando as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes do trabalho ou de doenças profissionais do trabalho;
- Quando as medidas de proteção coletiva estiverem sendo implantadas;
- Para atender a situações de emergência.
Dessa forma, toda empresa – cujas atividades possam oferecer algum risco à saúde do funcionário -, deve fornecer esses equipamentos. Além disso, também devem garantir que estão em boa qualidade, orientar seu uso de forma adequada, e substituí-lo, caso seja danificado.
Caso contrário, estarão sujeitas a penalidades e multas.
Agora, caso o trabalhador venha a sofrer algum acidente, o principal procedimento que deve ser tomado imediatamente pela empresa é a Comunicação do Acidente do Trabalho.
Explicaremos em detalhes como realizar essa comunicação daqui a pouco. Mas aqui, podemos adiantar que ela deve ser encaminhada à Previdência Social até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência, detalhando o acidente ocorrido e o trabalhador que foi lesionado.
Caso essa comunicação não seja feita, a contratante sofrerá severas autuações do Ministério do Trabalho (MTE), segundo os art. 286 e 336 do Decreto nº 3.048/1999. Veja na íntegra:
Art. 286 – A infração ao disposto no art. 336 sujeita o responsável à multa variável entre os limites mínimo e máximo do salário-de-contribuição, por acidente que tenha deixado de comunicar nesse prazo.
§ 1º – Em caso de morte, a comunicação a que se refere este artigo deverá ser efetuada de imediato à autoridade competente.
§ 2º – A multa será elevada em duas vezes o seu valor a cada reincidência.
§ 3º – A multa será aplicada no seu grau mínimo na ocorrência da primeira comunicação feita fora do prazo estabelecido neste artigo, ou não comunicada, observado o disposto nos arts. 290 a 292.
Art. 336 – Para fins estatísticos e epidemiológicos, a empresa deverá comunicar à previdência social o acidente de que tratam os arts. 19, 20, 21 e 23 da Lei nº 8.213, de 1991, ocorrido com o segurado empregado, exceto o doméstico, e o trabalhador avulso, até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena da multa aplicada e cobrada na forma do art. 286.
Por fim, a terceira obrigação das empresas é a concessão de todos os direitos aos trabalhadores acidentados.
Esses benefícios são assegurados pelo INSS, e só poderão ser concedidos por meio do documento gerado pela Comunicação do Acidente de Trabalho, que comprovará a incapacidade do profissional continuar exercendo suas atividades.
Para entender melhor estes últimos processos, detalhamos cada um deles nos próximos tópicos. Preste muita atenção, pois o não cumprimento deles pode acarretar em sérias consequências econômicas para o seu negócio.
Vamos lá.
Como fazer a comunicação de acidente de trabalho?
Como dissemos acima, a comunicação do acidente do trabalho deve ser enviado à Previdência Social em até um dia útil à sua ocorrência, e em caso de mortes, deve ser feito imediatamente.
Este documento tem o objetivo de contribuir para que os órgãos federais possam pesquisar e analisar estatísticas, além de possibilitar que o trabalhador receba seus direitos previstos em lei.
Ele pode ser enviado tanto pela própria empresa, quanto pelo funcionário ou seus representantes legais. Este processo pode ser feito de duas formas: online ou presencialmente.
No primeiro caso, basta acessar o site da Previdência Social, onde o responsável terá que preencher todos os campos obrigatórios.
Além disso, a plataforma também permite a emissão de um formulário em branco, para que as informações sejam preenchidas manualmente.
Já no segundo caso, essa comunicação pode ser feita presencialmente em uma das agências do INSS. Para isso, o formulário da CAT deverá estar inteiramente preenchido e assinado, com todos os dados referentes ao atendimento médico.
Hoje em dia, existem três tipos de CAT que podem ser emitidos:
- Inicial – quando acontece o acidente de trabalho, doença ocupacional, acidente de trajeto ou óbito;
- Reabertura – quando há um agravamento de lesões por conta de acidente ou doença do trabalho;
- Óbito – em caso de morte do trabalhador.
Com este documento em mãos, o INSS pode conceder todos os benefícios assegurados ao trabalhador lesionado. Confira quais a seguir.
Quais são os direitos de quem sofre um acidente de trabalho?
A maior dúvida dos trabalhadores é em relação ao salário. Os empregados que sofreram acidente de trabalho podem ficar tranquilos, pois continuarão recebendo sua remuneração. Os primeiros 15 dias de afastamento são pagos pela empresa. A partir do décimo sexto dia, é o INSS que passa a remunerar o funcionário.
Ao empregado que sofreu o sinistro, será destinado, por parte do INSS, o benefício chamado auxílio-acidente, que é uma derivação do auxílio-doença. Um fator benéfico ao trabalhador é que o auxílio-acidente não depende de carência. Ou seja, o profissional recebe a remuneração mensal independentemente de já ter contribuído para a Previdência. Basta ser segurado.
O trabalhador também faz jus a outros direitos perante a empresa. Podemos citar:
Garantia e estabilidade de emprego
O acidentado precisa ter o CAT emitido e ficar mais de 15 dias afastados de suas funções. Com isso, ele recebe o auxílio do INSS e, ao retornar ao trabalho, terá seu contrato de trabalho garantido por 12 meses.
Afastamento remunerado
Independentemente do tempo de afastamento do trabalho, o trabalhador continua a receber o seu salário integralmente.
Recolhimento do FGTS
Mesmo que o afastamento seja superior a 15 dias, o funcionário tem direito a ter seu Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) recolhido pelo empregador.
Aposentadoria por invalidez
Quando comprovada a incapacidade do trabalhador em retornar às suas funções, ele tem o direito de se aposentar por invalidez junto ao INSS. Caso a incapacidade seja considerada parcial, existe a chamada aposentadoria especial.
Indenização por danos materiais e restituição de gastos com medicamentos e tratamento
Partindo do mesmo fundamento que determina uma indenização por danos morais em caso de sequelas decorrentes de acidente de trabalho, temos a obrigação da empresa de indenizar o trabalhador acidentado por danos materiais.
O dano material envolve uma projeção direta e imediata nos interesses econômicos da vítima do dano e, por isso, é facilmente mensurável em termos pecuniários.
O prejuízo material, ou perdas e danos, compreende a recomposição do prejuízo correspondente àquilo que o reclamante efetivamente perdeu em razão do acidente.
A indenização referente ao dano material envolve as despesas da vítima com diárias hospitalares, honorários médicos e medicamentos.
Indenização por danos morais e estéticos
A indenização por acidente de trabalho, independentemente dos benefícios acidentários, está prevista expressamente na Constituição da República de 1988. Com efeito, estabelece o artigo 7º da Constituição Federal, inciso XXVIII.
A indenização moral objetiva minimizar a dor sentida pela vítima, compensando-a pelo sofrimento.
O dano estético se caracteriza pela alteração da forma de origem da vítima, o enfeiamento do corpo, a diferença entre o seu estado normal para um estado de inferiorização, o qual, como o dano moral, também causa embaraço, porém de forma visual, estética.
De acordo com o Código Civil atual (art. 949), qualquer lesão significante que altere a vida social e pessoal da vítima, mediante constrangimento e sentimento de desprezo pela exposição da imagem alterada em razão da lesão sofrida, configura dano estético.
Pensão por morte
Quando há a morte do trabalhador por conta de acidente de trabalho, os seus dependentes têm direito a receber uma pensão.
O que fazer quando a empresa se nega a emitir o CAT
Não raro, a empresa ou o empregador doméstico não reconhece o acidente de trabalho e se nega a emitir o CAT. Neste caso, como o trabalhador deverá agir ante a negativa do seu empregador? Haverá prejuízo numa possível concessão de benefício de natureza acidentária?
No que tange ao primeiro questionamento, o próprio segurado poderá registrar o CAT junto à Previdência Social a qualquer momento, sem o prejuízo de posterior aplicação de multa ao empregador.
Ademais, poderão registrar o CAT o dependente do segurado, o médico ou até mesmo o sindicato de sua categoria profissional.
Todavia, voltando-se ao segundo questionamento, se haverá prejuízo na concessão de benefício de natureza acidentária, muito embora o CAT seja o documento hábil para a informação de acidente de trabalho à Previdência Social, reposta é NÃO. Poderá haver a concessão de benefício previdenciário de natureza acidentária, mesmo sem a apresentação do CAT.
Quando recorrer ao Judiciário?
Não é raro encontrar situações onde o empregador se recusa a emitir o CAT para o empregado envolvido em acidente de trabalho ou doenças relacionadas ao trabalho, deixando o seu colaborador sem o amparo que poderia ter da previdência social, além das verbas indenizatórias nos casos que forem apurados dolo ou culpa por parte da empresa.
Não é difícil também, situações onde o trabalhador possui o CAT, porém, seu pedido do auxílio acidentário foi negado pelo INSS, tendo em vista que na visão da entidade pública, o trabalhador possui condições de trabalhar ou de que não há nexo entre agravo e trabalho.
Diante dessas situações, não resta outra opção ao trabalhador a não ser buscar a intervenção do poder judiciário frente a questão e buscar seus direitos.
Conclusão
Por mais indesejáveis que sejam, os acidentes de trabalho são recorrentes em muitas organizações cujas atividades ofereçam algum tipo de risco a seus colaboradores, principalmente na construção civil.
O melhor a fazer quando ocorrer um acidente de trabalho ou doença ocupacional, é procurar o apoio de um advogado. O profissional poderá avaliar a extensão dos danos e todas as particularidades do caso para determinar quais são os direitos que podem ser administrativa ou judicialmente requeridos.
Para isso, é importante que o trabalhador guarde todos os documentos relacionados aos danos sofridos pelo acidente, como atestados médicos, prontuários, recibos e fotografias. Isso permitirá uma análise detalhada dos fatos e facilitará a comprovação dos seus direitos.