Por Tatiane Oliveira da Silva
A separação de um casal sempre gera sofrimento para os filhos. Com o tempo, no entanto, as emoções mais exacerbadas –revolta, raiva, mágoa– costumam se abrandar.
A rotina se ajeita e os envolvidos aprendem, mesmo que na marra, a lidar com outras formas de se relacionar. Pais e mães conscientes de seus papéis costumam se esforçar para que os filhos se machuquem o menos possível, mas, infelizmente, nem todos colocam o bem-estar de crianças e jovens em primeiro lugar.
Não são poucos os casos de adultos que, tomados pela revolta causada pelo divórcio, transformam os filhos em artilharia pesada para castigar os ex-parceiros. Infelizmente, a chamada alienação parental é mais comum do que se imagina e extremamente prejudicial.
É uma forma de abuso psicológico contra a criança, que pode causar consequências intensas, capazes de afetar o desenvolvimento. As sequelas são para a vida toda.
Alienação parental: não use seu filho como arma de vingança!
2. Atitudes comuns dos pais que praticam a alienação
3. Consequências da alienação parental
4. Quais as punições para o alienador?
5. Como e a quem buscar ajuda diante das consequências da alienação parental?
6. Como provar a alienação parental?
Registre os padrões comportamentais
SUMÁRIO
Toggle1. O que é alienação parental
A alienação parental, expressão cunhada pelo psiquiatra norte-americano Richard Gardner nos anos 1980, inclui toda ação realizada pelo pai ou pela mãe (que na psicologia são designados pelo termo “genitor alienante”) com o objetivo de levar o filho a romper os vínculos afetivos com o outro genitor (chamado de “genitor alienado”).
Geralmente o alienante nutre raiva, dor, sofrimento, angústia e vingança contra o ex. cônjuge que decidiu pôr um fim na relação. Buosi destaca que:
“[…] o inconformismo do cônjuge com a separação, a depressão, a insatisfação das condições econômicas advindas pelo fim do relacionamento, a necessidade de posse exclusiva sobre os filhos, a solidão a que se vê no presente ou o fato do ex-cônjuge manter a relação com o parceiro da relação extramatrimonial que adveio a separação são causas determinantes para que um dos cônjuges (geralmente o detentor da guarda) utilize-se da única “arma” que lhe resta para atingir e vingar-se de outro: os filhos do ex-casal.”2
Quem detém a guarda dos filhos, na maioria dos casos, é quem pratica a alienação parental. Muitas vezes de forma inconsciente. Tal fato também pode ocorrer em casais que ainda vivem juntos ou, também, por aquele que não detém a guarda. Aliás, essa prática pode ocorrer por parte de outros parentes, como avós, tios e irmãos, inclusive por ambos pais.
A finalidade de praticar a alienação parental é apenas uma: fazer com que a criança escolha se afastar de um dos seus genitores. Para isso são contadas histórias falsas, ou até verdadeiras, mas deturpadas e, de alguma forma, maculando a imagem do outro genitor.
2. Atitudes comuns dos pais que praticam a alienação
- Não comunicar ao “ex” fatos importantes relacionados à vida dos filhos (escola, médico etc.)
- Tomar decisões importantes sem consultar o outro genitor, como escolha de escola ou pediatra
- Reclamar quando a criança demonstra contentamento em estar com o pai ou a mãe
- Interferir nas visitas, controlando excessivamente seus horários ou interrompendo-as
- Recordar, com insistência, fatos ocorridos que levem a criança a se afastar do outro genitor
- Nas brigas, obrigar a criança a tomar partido de um ou de outro
- Transformar a criança em espiã da vida do ex-cônjuge
- Quebrar, esconder ou cuidar mal dos presentes que o genitor alienado dá ao filho
- Denegrir, aberta ou sutilmente, a imagem do outro genitor
- Criticar a profissão ou situação financeira do “ex”
- Em casos extremos, acusar falsamente o “ex” de uso de drogas, álcool e abuso sexual
As atitudes vingativas vão desde não comunicar fatos envolvendo a vida da criança ao “ex” até convencer a criança de que o outro é uma pessoa mentirosa, de má índole e que não nutre nenhum tipo de sentimento bom por ela. “Senão não teria lhe abandonado” é um dos argumentos.
Sob incentivo do genitor magoado, a criança passa a desrespeitá-lo, difamá-lo ou importuná-lo, dando a impressão de que esqueceu os bons momentos que viveu ao seu lado.
Uma das formas mais drásticas para tentar separar a criança ou adolescente do genitor alienado é a utilização das falsas denúncias, em especial a de abuso sexual.
O genitor alienante começa a construir falsas memórias em seu filho, geralmente em crianças com idade reduzida, onde é mais fácil a manipulação e mais tênue a distinção entre fantasia e realidade. Acontecem verdadeiras lavagens cerebrais.
3. Consequências da alienação parental
O contato com ambos os pais é necessário para o desenvolvimento psicológico saudável de qualquer criança e adolescente.
Quando os vínculos afetivos existentes entre um filho e seu genitor são quebrados, ela sente uma grande perda. E ser levada a rejeitar um genitor a quem amava a faz sentir-se abandonada, insegura, com raiva e ódio.
Além desses sintomas, os adolescentes também podem demonstrar comportamentos de rebeldia e agressividade e passar a consumir álcool e drogas como forma de aliviar a dor e culpa da alienação.
Na vida adulta, há forte chance de a pessoa ter dificuldades de relacionamentos afetivos, sociais e profissionais e, na mais cruel das hipóteses, repetir o comportamento do genitor alienante.
4. Quais as punições para o alienador?
Somente um juiz, acompanhado por um advogado de Direito de Família, pode declarar ocorrência de alienação parental e advertir aquele que aliena.
Conforme prevê o art. 6º da Lei 12.318/10, que trata do tema, uma vez caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência da criança ou do adolescente com o genitor, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e segundo a gravidade do caso, adotar as seguintes medidas:
- advertir o alienador;
- ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
- estipular multa ao alienador;
- determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
- determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
- determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
- declarar a suspensão da autoridade parental.
Por outro lado, se for caracterizada a mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar (visitas), o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou o adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.
O objetivo consiste em preservar o direito fundamental da convivência familiar saudável, preservando-se o afeto devido nas relações entre filhos e genitores no seio do grupo familiar.
Em casos mais extremos, o alienante poderá ser processado penalmente pela prática do crime de denunciação caluniosa ou de comunicação falsa de delito ou de contravenção, de acordo com o caso específico.
Aqui, cabe ressaltar que discursos como “Ah, mas eu sou mãe e pai”, ou “O pai (ou mãe) não presta”, ou até mesmo “Quem sabe sou eu, não a Justiça” são extremamente equivocados e podem, sim, trazer consequências a mãe ou ao pai que aliena o filho.
5. Como e a quem buscar ajuda diante das consequências da alienação parental?
O recomendado a quem esteja passando por uma situação semelhante e já tentou várias alternativas, mas nada resolveu o problema, é buscar ajuda judicial.
Recolha provas suficientes para buscar na Justiça uma solução. Prints de conversas e testemunhas são tipos de provas que podem ajudar.
Um advogado especialista em Direito de Família é quem pode cuidar desse processo exaustivo a todos, principalmente à criança, uma vez que as consequências da alienação parental podem perdurar por anos.
Além disso, reforçamos que não só as crianças, bem como os adolescentes sejam acompanhadas por um psicólogo.
6. Como provar a alienação parental?
Existem algumas maneiras de provar que a criança está sofrendo alienação parental, como por meio de conteúdos enviados por WhatsApp ou e-mail. Mais um importante instrumento é um relatório de psicólogo que evidencie essa prática.
Entender e conhecer o comportamento do seu filho ou a criança e adolescente que você acompanha é o primeiro passo para identificar alienação parental. Comece a registrar situações e mantenha anotado todos os incidentes e conversas que aconteceram quando ele estava com o outro genitor.
Essas anotações fazem toda a diferença para provar a alienação parental e precisam ser alimentadas. Registre se o outro genitor tenta mudar acordos, horários e dias. Reúna também conversas com o outro genitor, principalmente em casos de acusações ou desacordos de tratos.
Quando a alienação parental está acontecendo, é natural notar mudanças no comportamento dos filhos em seu relacionamento e nas atitudes da criança. É claro que isso muda de acordo com sua idade e personalidade, mas é preciso estar atento a todos os sinais.
Observe se o filho está mais distante, se faz acusações, guarda segredos e tem muitos códigos com o outro genitor, quer deixar de fazer visitas e comparecer nos encontros programados, por exemplo.
Se o seu filho passa um fim de semana com o outro genitor, por exemplo, e não quer contar coisas e diz que é segredo ou que é um momento deles, desconfie do que pode estar acontecendo e se há instrução do ex-cônjuge para isso ocorrer.
É preciso saber que nem tudo é sobre alienação parental, às vezes é só uma forma que a criança ou adolescente está lidando com a separação e com o momento, mas é preciso estar atento a mudanças, das menores às maiores e alterações no comportamento.
Isso vai depender muito da idade da criança, mas quanto mais velha ela for e maior for seu grau de entendimento, mais fácil será entender sobre essas ações.
Independente de idade ou perfil de seu filho, use sempre o diálogo. Seja de forma mais lúdica ou não, explique a situação real e não deixe que o assunto divórcio seja um tabu.
É preciso que a criança entenda e tenha segurança que a separação do casal não faz com que os pais a deixem abandonadas. É essencial ter essa conversa com ambos os pais presentes e com discurso alinhado, afinal, mesmo com términos difíceis, é preciso saber manter a comunicação em prol dos filhos.
Pode ser interessante levar a criança até um psicólogo para que o tratamento a ajude a entender esse momento e a lidar com sua situação.
Mais do que isso, a criança ou adolescente pode se sentir mais confortável com o profissional para se abrir sobre determinados aspectos e, por serem treinados para diversos padrões comportamentais, eles podem também ser aliados para identificar caso haja suspeita de alienação parental.
Conversar com testemunhas, como outros adultos que mantêm contato com a criança ou o adolescente — é o caso, por exemplo, de um professor ou líder religioso — também pode ser relevante, especialmente nos casos em que o menor já relatou sobre a situação em que vive com tal indivíduo.
Depois de fazer registros, observar padrões e manter muito diálogo com o filho, se perceber que a alienação parental está acontecendo, é hora de tomar providências para conseguir provar o problema e para que o outro genitor receba as sanções necessárias.
Conclusão
A alienação parental fere direitos das crianças ou adolescentes vítimas desse abuso, nas situações em que tal conduta se torna impossível, é necessária a intervenção do poder judiciário para preservar os direitos básicos destes.
Converse com seu filho, conserve um diálogo aberto, isso é imprescindível, sobretudo quando o outro pai tenta fazer com que o menor pense que você não o ama ou não se importa com ele. Ouça o que ele tem a dizer, importe-se com seus sentimentos.
Esteja vigilante caso a criança simplesmente repita as coisas que o outro pai habitualmente diz ao invés de explicar com suas próprias palavras. Por exemplo, caso sua filha não o tenha visitado no sábado anterior, ela pode dizer algo como “O papai disse que você não podia ficar comigo porque estava muito ocupada”.
Converse com a criança sobre o que ela faz na casa do outro genitor, mas tente não fazer perguntas direcionadas. Se a criança quiser falar sobre o que fez, esteja disposto a ouvir; não tente forçar informações possivelmente nocivas dele.
Caso a criança diga algo que deixe subentendido uma conduta abusiva ou negligente, leve-a até um profissional em vez de ficar interrogando sobre o que ocorreu. Lembre-se de que a criança poderá ficar desconfortável caso sinta que está delatando o outro pai.
Em caso de alienação parental, tente, primeiramente, resolver de forma amigável com o genitor da criança, caso não resolva, documente tudo e busque uma advogada especializada na área de família.
1 DIAS, Maria Berenice. Incesto e alienação parental. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 78.
2 BUOSI, Caroline de Cássia Francisco. Alienação parental: uma interface do direito e da psicologia. Curitiba: Juruá, 2012, p. 57.
3 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 320.
4 FIGUEIREDO, Fábio Vieira; ALEXANDRIDIS, Georgios. Alienação parental. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 44.
5 BARROS, Gabriela dos Santos. Análise poliédrica da alienação parental e da síndrome de alienação parental. Acesso em: 15 de junho de 2021.