Por Tatiane Oliveira da Silva
Recebemos em nosso escritório inúmeras mulheres vítimas de violência doméstica que não sabem que atitudes devem tomar, pois muitas delas dependem emocional e economicamente do agressor, além de terem muito medo deles.
Diante de tantos questionamentos e buscando ajudar essas vítimas de violência doméstica, resolvemos escrever esse artigo.
SUMÁRIO
Toggle1. O que é violência doméstica e familiar?
É um abuso físico ou psicológico de um membro de um núcleo familiar em relação a outro, com o objetivo de manter poder ou controle. Esse abuso pode acontecer por meio de ações ou de omissões. A maioria das vítimas desse crime são mulheres.
2. Tipos de violência doméstica e familiar
- Violência contra a mulher – é qualquer conduta – ação ou omissão – de discriminação, agressão ou coerção, ocasionada pelo simples fato de a vítima ser mulher e que cause dano, morte, constrangimento, limitação, sofrimento físico, sexual, moral, psicológico, social, político ou econômico ou perda patrimonial. Essa violência pode acontecer tanto em espaços públicos como privados.
- Violência de gênero – violência sofrida pelo fato de se ser mulher, sem distinção de raça, classe social, religião, idade ou qualquer outra condição, produto de um sistema social que subordina o sexo feminino.
- Violência doméstica – quando ocorre em casa, no ambiente doméstico, ou em uma relação de familiaridade, afetividade ou coabitação.
- Violência familiar – violência que acontece dentro da família, ou seja, nas relações entre os membros da comunidade familiar, formada por vínculos de parentesco natural (pai, mãe, filha etc.) ou civil (marido, sogra, padrasto ou outros), por afinidade (por exemplo, o primo ou tio do marido) ou afetividade (amigo ou amiga que more na mesma casa).
- Violência física – ação ou omissão que coloque em risco ou cause dano à integridade física de uma pessoa.
- Violência institucional – tipo de violência motivada por desigualdades (de gênero, étnico-raciais, econômicas etc.) predominantes em diferentes sociedades. Essas desigualdades se formalizam e institucionalizam nas diferentes organizações privadas e aparelhos estatais, como também nos diferentes grupos que constituem essas sociedades.
- Violência intrafamiliar / violência doméstica – acontece dentro de casa ou unidade doméstica e geralmente é praticada por um membro da família que viva com a vítima. As agressões domésticas incluem: abuso físico, sexual e psicológico, negligência e abandono.
- Violência moral – ação destinada a caluniar, difamar ou injuriar a honra ou a reputação da mulher.
- Violência patrimonial – ato de violência que implique dano, perda, subtração, destruição ou retenção de objetos, documentos pessoais, bens e valores.
- Violência psicológica – ação ou omissão destinada a degradar ou controlar as ações, comportamentos, crenças e decisões de outra pessoa por meio de intimidação, manipulação, ameaça direta ou indireta, humilhação, isolamento ou qualquer outra conduta que implique prejuízo à saúde psicológica, à autodeterminação ou ao desenvolvimento pessoal.
- Violência sexual – acão que obriga uma pessoa a manter contato sexual, físico ou verbal, ou a participar de outras relações sexuais com uso da força, intimidação, coerção, chantagem, suborno, manipulação, ameaça ou qualquer outro mecanismo que anule ou limite a vontade pessoal. Considera-se como violência sexual também o fato de o agressor obrigar a vítima a realizar alguns desses atos com terceiros.
Consta ainda do Código Penal Brasileiro: a violência sexual pode ser caracterizada de forma física, psicológica ou com ameaça, compreendendo o estupro, a tentativa de estupro, o atentado violento ao pudor e o ato obsceno.
3. Exemplos de situações de violência
A Lei Maria da Penha não contempla apenas os casos de agressão física. Também estão previstas as situações de violência psicológica, sexual, patrimonial e moral.
- Humilhar, xingar e diminuir a autoestima
Condutas como humilhação, desvalorização moral ou deboche público em relação a mulher constam como tipos de violência emocional.
- Tirar a liberdade de crença
Um homem não pode restringir a ação, a decisão ou a crença de uma mulher. Isso também é considerado como uma forma de violência psicológica.
- Fazer a mulher achar que está ficando louca
Há inclusive um nome para isso: o gaslighting. Uma forma de abuso mental que consiste em distorcer os fatos e omitir situações para deixar a vítima em dúvida sobre a sua memória e sanidade.
- Controlar e oprimir a mulher
Aqui o que conta é o comportamento obsessivo do homem sobre a mulher, como querer controlar o que ela faz, controlar o que ela vestirá, não a deixar sair, isolar sua família e amigos ou procurar mensagens no celular ou e-mail. As condutas descritas podem caracterizar violência psicológica.
- Expor a vida íntima
Falar sobre a vida do casal para outros é considerado uma forma de violência moral, como, por exemplo, vazar fotos íntimas nas redes sociais como forma de vingança.
- Atirar objetos, sacudir e apertar os braços
Nem toda violência física é o espancamento. São considerados também como abuso físico a tentativa de arremessar objetos com a intenção de machucar, sacudir e segurar com força uma mulher.
- Forçar atos sexuais desconfortáveis
Não é só forçar o sexo que consta como violência sexual. Obrigar a mulher a fazer atos sexuais que causam desconforto ou repulsa, como a realização de fetiches, também é violência.
- Impedir a mulher de prevenir a gravidez ou obrigá-la a abortar
O ato de impedir uma mulher de usar métodos contraceptivos, como a pílula do dia seguinte ou o anticoncepcional, é considerado uma prática
da violência sexual. Da mesma forma, obrigar uma mulher a abortar também é outra forma de abuso.
- Controlar o dinheiro ou reter documentos
Se o homem tenta controlar, guardar ou retirar o dinheiro de uma mulher contra a sua vontade, assim como reter documentos pessoais da mulher,
isso é considerado uma forma de violência patrimonial.
- Quebrar objetos da mulher
Outra forma de violência ao patrimônio da mulher é causar danos de propósito a objetos dela, ou objetos que ela goste.
4. Como pedir ajuda em caso de violência doméstica e familiar
Em casos de violência doméstica e familiar contra mulher em Canoas, entre em contato com um serviço de atendimento.
Se a violência estiver acontecendo, a vítima ou qualquer outra pessoa deverá telefonar imediatamente para o 190 a fim de que a Brigada Militar se desloque até o local do fato para prestar socorro.
Se a violência já aconteceu, a vítima deverá ir, preferencialmente à Delegacia da Mulher, onde houver, ou a qualquer Delegacia de Polícia para fazer o Boletim de Ocorrência e solicitar as medidas protetivas.
- Delegacia Online
A delegaciaonline.rs.gov.br é uma plataforma digital criada pela Polícia Civil do RS onde as vítimas podem relatar as agressões sofridas sem ter que ir até a delegacia e que também facilita a solicitação de medidas protetivas de urgência.
A Central funciona diariamente, 24h por dia, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil e de mais 16 países (Argentina, Bélgica, Espanha, EUA (São Francisco), França, Guiana Francesa, Holanda, Inglaterra, Itália, Luxemburgo, Noruega, Paraguai, Portugal, Suíça, Uruguai e Venezuela).
Recebe denúncias ou relatos de violência contra a mulher, reclamações sobre os serviços de rede, orienta sobre direitos e acerca dos locais onde a vítima pode receber atendimento.
A denúncia será investigada e a vítima receberá atendimento necessário, inclusive medidas protetivas, se for o caso. A denúncia pode ser anônima.
Para orientação quanto aos seus direitos e deveres, a vítima poderá procurar a Defensoria Pública, na sua cidade ou, se for o caso, consultar advogado(a).
Espaços de acolhimento/atendimento psicológico e social, orientação e encaminhamento jurídico à mulher em situação de violência.
5. Como ocorre o atendimento policial às vítimas de violência doméstica e familiar contra a mulher?
É importante falar, ainda, sobre o atendimento policial às vítimas de violência doméstica e familiar. A autoridade policial que tomar conhecimento da violência ou da possibilidade da violência doméstica deverá, de imediato, tomar determinadas providências legais.
A vítima deverá receber atendimento policial e pericial especializado, como a realização do exame de corpo de delito, ininterrupto e prestado por servidores – preferencialmente do sexo feminino – previamente capacitados.
A inquirição da mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de testemunha de violência doméstica deverá observar, ainda, as seguintes diretrizes:
- Salvaguarda da integridade física, psíquica e emocional da depoente.
- Garantia de que, em nenhuma hipótese, vítima e testemunhas terão contato direto com investigados ou suspeitos e pessoas a eles relacionadas.
- Não revitimização da depoente, evitando sucessivas inquirições sobre o mesmo fato.
- Realização da inquirição em recinto especialmente projetado para esse fim.
No atendimento, a autoridade policial deverá garantir o transporte da ofendida e seus dependentes para local seguro e informar a vítima acerca de seus direitos.
6. Quais são as medidas protetivas de urgência cabíveis em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher?
Medidas protetivas de urgência são medidas tomadas quando há um perigo iminente, para evitar que algo aconteça.
Nos casos de violência doméstica contra a mulher, depois de feita a ocorrência, o juiz, no prazo de 48 horas, deverá determinar o encaminhamento da vítima para a assistência judiciária, comunicar sobre o caso ao Ministério Público e determinar a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor, caso seja o caso.
Além disso, algumas medidas protetivas de urgência que podem ser tomadas são:
- Afastamento do agressor do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida (medida tomada pela autoridade judicial; pelo delegado de polícia, quando o município não for sede da comarca, ou pelo policial, quando, além de o município não ser a sede da comarca, não houver delegado disponível no momento da denúncia);
- Proibição de determinadas condutas do agressor, como aproximação e contato com a vítima;
- Restrição ou suspensão de visitas do agressor aos dependentes menores;
- Prestação de alimentos provisionais ou provisórios e
- Comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação.
7. Outras aplicações da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06): homens e pessoas LGBTQIA+
A aplicação originária da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) é em relação a mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. No entanto, a norma também pode ser aplicada a outros casos, como, por exemplo, a homens e pessoas LGBTQIA+ vítimas de violência doméstica e familiar.
No que se refere especificamente aos homens, é importante notar que, apesar do que possa ser falsamente propagado, eles também podem ser vítimas de violência doméstica e familiar, situação que causa, além do sofrimento da violência em si, o sofrimento causado pelo preconceito da sociedade para com essas vítimas.
Como consequência do machismo, tão presente na sociedade, muitas vezes eles acabam por ouvir afirmações falsas como “homem de verdade não sofre com isso”. No entanto, é fundamental que a vítima saiba da importância da denúncia, para que possa ter seus direitos assegurados e se proteger da figura que o agride.
8. Como se dá o processo penal nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher?
As normas aplicadas ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher são aquelas previstas no Código de Processo Penal e no Código de Processo Civil, bem como na legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso quando for o caso.
Além disso, conforme disciplina o art. 14 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06), “os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, podem ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher”.
Ainda no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, pode ocorrer, caso seja do interesse da vítima, pode ser proposta a ação de divórcio ou dissolução de união estável, apesar de o Juizado não versar sobre partilha de bens.
No que se refere à competência, a ação no Juizado se dará na seguinte ordem de prioridade: local do domicílio ou residência da vítima, local do fato em que se baseou a demanda e local do domicílio do agressor.
9. Quais são as penas aplicadas nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher?
As penas aplicadas nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher variam de um a três anos de detenção, sendo “vedada a aplicação de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa” (art. 17 da Lei Maria da Penha/Lei 11.340/06).
10. A importância da advogada em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher
Os casos de violência doméstica e familiar contra as mulheres são delicados, de modo que é importante que sejam tratados com o devido cuidado. Muitas vezes, as vítimas têm dificuldade de denunciar casos de violência doméstica e familiar por temerem que nada aconteça e as ocorrências aumentem.
O preconceito sofrido pela vítima também influencia nesses casos, uma vez que, não raro, acontecem questionamentos sobre a veracidade do depoimento da vítima.
No entanto, denunciar o crime é muito importante para que as medidas cabíveis sejam tomadas e as vítimas sejam protegidas.
Para auxiliar no momento da denúncia e também nos passos seguintes, ajudando a vítima a estar sempre bem assistida e evitar processos de revitimização, o serviço de uma advogada especialista em casos de violência doméstica e familiar é muito importante.
Conclusão
A melhor solução é sempre a integridade física e psicológico de todos os envolvidos. Se para isso for necessário a mulher abandonar a relação, ela certamente deverá tomar essa atitude, mas sempre com muito cuidado, buscando apoio de amigos, familiares e profissionais.
A lei oferece várias medidas para proteger a integridade física e o patrimônio da mulher.
Ela prevê a saída do agressor de casa ,a proteção dos filhos ,direito de a mulher reaver seus bens e cancelar procurações feitas pelo agressor e até uma distância mínima para ele se manter em relação à vítima. Em casos extremos ,o juiz pode direcionar a mulher para um abrigo,mas eles são em número muito pequeno.
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