Quem viveu em união estável tem direito à herança?

Por Tatiane Oliveira da Silva

Estabelecer uma família sem casar tem sim uma das opções de muitos brasileiros atualmente. O estado desse relacionamento é conhecido como união estável.

O reconhecimento disso foi uma inovação na lei no sentido de diferenciar essa situação do matrimônio e do mero namoro, considerando esse vínculo como uma relação contínua e duradoura de convivência, firmada entre duas pessoas com o intuito de constituir uma família.

Entretanto, isso ainda gera diversas dúvidas sobre os direitos no caso do falecimento de um dos companheiros.

Quer saber mais sobre o assunto? Então continue a leitura e confira nos seguintes tópicos mais detalhes sobre esse tema.

 

1. O que configura união estável?

Basicamente podemos dizer que há união estável quando duas pessoas se unem, de forma duradoura, contínua, e com convivência pública, com o objetivo de constituir família.

O Código Civil Brasileiro reconhece a união estável como forma de entidade familiar, estabelecendo quatro requisitos. Segundo o artigo 1.723 do Código Civil, a relação deve ser:

  • Duradoura;
  • Contínua;
  • Pública;
  • Com o objetivo de constituir família;

2. É necessário um período mínimo para configurar a união estável?

Não! Não existe prazo mínimo para que um relacionamento seja classificado como união estável. Os requisitos da união estável estão elencados no nosso Código Civil, em seu artigo 1.723, são eles:

  1. Dualidade de sexos (que apesar de previsto no CC/02 e CR/88, foi superado em virtude do reconhecimento das uniões homoafetivas;
  2. Publicidade (as pessoas do meio social dos companheiros tem conhecimento da relação);
  3. Durabilidade;
  4. Continuidade;
  5. Objetivo de construir família.

3. Precisa morar junto?

Não há essa exigência dentre os critérios estabelecidos por lei.

Então, se os companheiros morarem em casas separadas, mas a relação for duradoura, contínua, pública e com o objetivo de constituir família, será união estável!

4. É possivel união estável entre pessoas do mesmo sexo?

A Lei, ao definir união estável, descrevia uma relação entre homem e mulher.

Mas os tempos são outros, desde 2011 o Supremo Tribunal Federal já decidiu, e equiparou a união entre pessoas do mesmo sexo à união entre casais de sexos diferentes.

Ou seja, no Brasil desde 2011 há o reconhecimento da união estável homoafetiva como entidade familiar.

5. Como faço para comprovar a existência da união estável?

Nesse sentido, o primeiro passo é buscar a ajuda de um advogado que entrará com ação Judicial para reconhecimento da união.

Contudo, para você conseguir reconhecer a união estável após a morte do companheiro (a), será preciso trazer algumas informações como quanto tempo durou a união, se compraram bens durante a união, se o casal teve filhos, entre outros pontos que serão questionados.

Além disso, existem diversos documentos que podem ser utilizados para comprovar a união estável, como:

Dentre esses documentos que podem ser apresentados ao INSS temos:

  • Declaração de Imposto de Renda em que consta o cônjuge como dependente;
  • Disposições testamentárias;
  • Carteira de Trabalho;
  • Certidão de nascimento dos filhos (caso o casal tenha);
  • Certidão de Casamento Religioso (em casos onde não houve casamento em cartório, mas houve no religioso);
  • Prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão nos atos de vida civil;
  • Conta bancária conjunta;
  • Registro em associação de qualquer natureza onde conste o interessado como dependente do segurado;
  • Apólice de seguro onde conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;
  • Ficha de tratamento em instituição de assistência médica da qual conste o segurado como responsável;
  • Escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome do dependente;
  • Testemunhas.

Para garantir o reconhecimento da união estável o processo deve acontecer contra os herdeiros do companheiro (a) falecido.

Logo, os herdeiros como filhos de um relacionamento anterior ao seu é que deverão responder pela ação. Com a comprovação da união, você fará parte do inventário e pleiteia os bens deixados.

6. Companheira em união estável tem direito à herança?

Antes de mais nada é preciso considerar que os direitos de cônjuges e companheiros se aproximam em vários aspectos, havendo poucas questões que as afastem no que diz respeito a direitos.

Com o reconhecimento constitucional da união estável, uma série de outras conquistas vieram em seguida.

Com relação à herança, sim, a companheira em união estável tem direito a ela, mas é preciso fazer uma diferenciação entre a condição de herdeira e de meeira.

Caso os conviventes não optem expressamente por um regime de bens diferente, será aplicado às uniões estáveis o regime da comunhão parcial de bens, ou seja, tudo que for adquirido pelo casal na constância da união estável será de ambos, no percentual de 50% para cada.

Imagine a situação de Eduardo e Mônica, conviventes que não regularizaram sua situação judicial, nem extrajudicialmente, aplicando então o regime de bens da comunhão parcial de bens. Na constância da união eles compraram um apartamento e dois automóveis, sendo esse o patrimônio comum do casal. Eduardo tinha um filho da relação anterior e um filho com Mônica.

Eduardo vem a falecer, deixando além do patrimônio comum um terreno que comprou antes de conhecer Mônica, mas que optaram por não usá-lo por conta do estresse de uma construção. Essa situação terá diferentes desdobramentos, a começar pela divisão do patrimônio comum.

Ainda que não fosse cônjuge, mas companheira de Eduardo, Mônica terá direito à meação dos bens adquiridos em conjunto, ou seja, 50% do apartamento e dos dois automóveis, figurando nessa situação como meeira.

Com relação ao terreno adquirido por Eduardo antes de se conhecerem, Mônica será herdeira, juntamente com os filhos de Eduardo – segundo entendimento recente do STJ. Nessa situação é possível notar como uma companheira pode ser herdeira do seu convivente.

7. Qual a diferença entre herança e meação?

Como vimos acima, quando as partes vivem em união estável sendo regidos pelo regime da comunhão parcial de bens, todo o patrimônio adquirido após o início da relação será considerado bem comum, o que significa dizer que metade do patrimônio é de propriedade de um cônjuge e que a outra metade é do outro, como em um condomínio.

Assim, após a separação ou no caso de morte, cada um será considerado meeiro, e terá reconhecido o seu direito a 50% desse patrimônio comum.

O direito à meação é inerente à constituição do patrimônio comum, se a parte resolver romper a relação ou o companheiro faleça, a outra parte terá direito a metade de todo o patrimônio constituído em conjunto, essa é a meação.

A herança é diferente, ela só existe com o evento morte e é destinada aos herdeiros, não haverá divisão da meação, por exemplo, que será resguardada à parte que lhe pertence.

8. Diferenças entre união estável e casamento no direito à herança

Quando falamos de herança e seu impacto nos casamentos e uniões estáveis, o primeiro ponto a ser considerado é a regulamentação da situação.

Os cônjuges possuem sua relação devidamente registrada, produzindo efeitos jurídicos desde a assinatura das partes e do juiz de paz, o que muitas vezes não ocorre com os conviventes.

O número de uniões estáveis registradas ainda é muito menor do que as uniões estáveis fáticas, isso porque as pessoas não costumam se preocupar com o registro dessa relação afetiva, parando para analisar a situação apenas quando algo acontece.

Com isso, na hipótese de morte de um companheiro, a diferença maior entre os dois institutos é que o cônjuge não precisará se preocupar em “legalizar” a relação, diferente do convivente.

Se não havia o registro da união estável, a(o) companheira(o) deverá ingressar com a ação de reconhecimento de união estável, com o fim de regularizar a situação e pleitear o que lhe é direito.

Se for devida uma pensão por morte, por exemplo, o INSS não contempla a convivente viúva sem a união estável reconhecida, sendo necessária a demonstração inequívoca da união estável.

Regimes de bens

Quando se celebra o matrimônio, as partes podem escolher livremente o regime de bens que prevalecerá na relação, sendo que o nosso ordenamento jurídico traz algumas opções para os cônjuges, sendo elas:

Comunhão Parcial de Bens

Conhecido também como regime legal, visto ser o regime aplicado caso o casal não opte por um diferente.

Aqui há três tipos de patrimônio, os individuais de cada um dos integrantes da relação amorosa e o patrimônio comum.

Bens adquiridos antes do casamento são individuais.

Os adquiridos depois não, pois há presunção de esforço comum, por isso tudo que o casal adquirir após o início da relação será considerado de ambos e quando da divisão, caberá 50% para cada um.

Comunhão Universal de Bens

Aqui encontramos o acervo patrimonial total do casal como patrimônio comum, ou seja, será composto pelos bens de ambos os cônjuges ou companheiros, independente de quando o bem foi adquirido.

Nesse cenário, não há que se falar em patrimônio individual, pois tudo que é de um, também é do outro.

Separação Total (ou convencional) de Bens

Aqui não há patrimônio comum do casal, sendo que cada cônjuge/companheiro será responsável por seus bens individuais, não importando se foram adquiridos antes ou depois do casamento.

Quando do fim da relação, cada qual sai com seus bens, sem maiores problemas.

Separação Obrigatória de Bens

Esse regime será automaticamente imposto às partes, mas segue a mesma linha de raciocínio da modalidade de separação total, ou seja, cada cônjuge ou companheiro entra e sai da relação com seus próprios bens, não há patrimônio comum.

A modalidade é obrigatória para os maiores de 70 anos de idade, para quem precisa de autorização legal para se casar e na hipótese de um dos cônjuges não ter realizado a separação de bens de uma relação anterior.

Participação Final nos Aquestos

Aqui há uma mistura de modalidades, é uma junção da separação total de bens e a comunhão parcial de bens.

Ocorre que o regime aplicado durante a relação é o da separação de bens, mas caso o casal venha a se divorciar, aplica-se o regime da comunhão parcial de bens. A regra aqui é a união com relação aos ganhos e divisão das perdas.

O regime geral aplicado na união estável também é da comunhão parcial de bens, mas um contrato escrito entre os companheiros pode mudar esse regime e definir o que melhor se encaixar na realidade das partes.

9. Bens em nome da companheira entram na partilha da herança?

Primeiro é preciso pontuar que não há herança de pessoa viva. Se havia patrimônio comum do casal em nome da companheira, sendo no regime da comunhão parcial, esses bens devem compor a partilha.

10. Ex-companheiros têm direito à herança?

A lei é clara nesse sentido estipulando que só terá direito a herança o cônjuge se não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

11. É possível o reconhecimento de união estável após a morte por meio do processo de inventário?

O companheiro interessado no reconhecimento da união após a morte do outro, deverá com um advogado especialista em direito sucessório entrar com um processo, comprovando o período de duração da união, e os frutos que ela resultou, como o nascimento de filhos e os bens adquiridos.

Com o auxílio de um advogado, o processo de reconhecimento de união estável após a morte deverá ser interposto em face dos herdeiros necessários do falecido, conforme a ordem de sucessão estabelecida por lei.

12. É possível o reconhecimento de união estável após a morte por meio do inventário extrajudicial?

Nesta hipótese, o companheiro sobrevivente deverá comparecer a um cartório e informar a existência da união estável.

Com isso, será elaborado um documento chamado de “escritura pública” que será preenchido com os dados pessoais do casal; a data de início da união e o regime de bens adotado.

A condição para a validade desse procedimento em cartório está na Resolução nº 35 de 2007 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), onde tornou possível o reconhecimento da união estável por esta via, desde que dentro do inventário extrajudicial do companheiro falecido, logo, deve haver acordo entre todos os herdeiros sobre a partilha de bens e não pode existir testamento ou menores de idade ou incapazes envolvidos.

13. Meu cônjuge recebeu uma herança. Se ele morrer, tenho direito?

Como já explicado acima, na união estável, sem estipulação por escrito de regime de bens diverso, o regime de bens adotado automaticamente é o da ‘comunhão parcial de bens’, o que implica compartilhamento de todo o patrimônio adquirido onerosamente durante a convivência familiar em igual proporção, sendo presumido o esforço comum dos companheiros na aquisição dos bens, salvo se estipulado em contrário em contratos ou escrituras.

Por sua vez, os bens considerados particulares (aqueles adquiridos antes da união estável, ou recebidos por doação ou herança durante o matrimônio, ou sub-rogados em seu lugar), não integram o patrimônio comum do casal para efeito de partilha de bens, são bens privativos de cada um.

Portanto, a herança recebida por seu companheiro, bem como os bens adquiridos (sub-rogados) com essa herança – como, por exemplo, a empresa constituída em sociedade com a irmã – são considerados ‘bens particulares’.

Vale dizer, em caso de fim do relacionamento em vida (dissolução da união estável), essa empresa não será partilhada entre vocês; todavia, os rendimentos distribuídos por essa empresa ao seu companheiro são, regra geral, bens partilháveis, pois considerados os frutos de bens particulares.

Já no caso de falecimento do seu companheiro, você terá direito à meação (metade) de todos os bens adquiridos onerosamente durante a união estável, bem como terá direito à herança quanto aos bens particulares por ele deixados – em concorrência com eventuais herdeiros legítimos.

14. O que é direito real de habitação e como ele funciona?

É assegurado ao viúvo ou a viúva (seja casamento ou união estável) a permanência no imóvel que era a residência do casal.

Tem o direito real de habitação caráter gratuito, assim é evidente que não podem os herdeiros exigir qualquer tipo de pagamento ao companheiro sobrevivente pelo uso do imóvel, nem mesmo a extinção do condomínio ou a alienação do bem pode ser requerida enquanto perdurar este direito.

Inclusive esse é o entendimento também do Supremo Tribunal de Justiça, que no REsp 1.846.167 a ministra Nancy Andrighi explicou em seu voto que o direito real de habitação reconhecido ao cônjuge ou companheiro sobrevivente decorre de imposição legal, têm natureza vitalícia e personalíssima, o que significa que ele pode permanecer no imóvel até a morte.

Em recente julgado o STJ decidiu que não é requisito para o reconhecimento do direito real de habitação a inexistência de outros bens, seja de que natureza for, no patrimônio próprio do cônjuge sobrevivente (AgInt no REsp 1.554.976/RS).

Conclusão

Se você teve um relacionamento público, contínuo e duradouro com o intuito de constituir família, é possível comprovar a união estável após a morte e ter os direitos em caso de falecimento.

Caso os filhos do seu companheiro te desmotivem ou até mesmo afirmem que você não tem direito a nada, não desanime!

Procure um advogado especialista em Família e Sucessões e garanta os seus direitos!

Dra. Tatiane Oliveira da Silva, advogada, casada, apaixonada por animais. Formada em 2003. Especialista em Direito de Família para Homens, com ênfase em Divórcio, Partilha de Bens, Guarda, Alienação Parental e Revogação de Medida Protetiva. Proprietária de escritórios, situados em Alvorada, Canoas e Porto Alegre e atendimento online no Brasil e no exterior.

Somos o único escritório do Brasil especializado em Direito de Família para Homens com Ênfase em Revogação de Medida Protetiva e Alienação Parental!


Agende uma Consulta



Leia mais artigos como esse em https://www.tatianeosilva.adv.br/blog



Acesse nossas Redes Sociais

dvisit.com.br/tatiane-oliveira-da-silva-advocacia-1-392679



Deixe um comentário